Um Interlúdio Fresco Relatório de Vindima Douro - 2021

2021-11-23

Um Interlúdio Fresco
Relatório de Vindima Douro - 2021

2021 Harvest (video) com Charles Symington, Diretor de Produção.

2021 lembrou-nos claramente que, embora o Douro esteja a ser impactado pelas alterações climáticas, o tempo continua a ser um fator imprevisível. A experiência e o conhecimento que temos das nossas vinhas ajudam-nos a planear a vindima, principalmente no que toca a vindimar as uvas no ponto ótimo, mas previsões de tempo inconstantes obrigam-nos a fazer ajustamentos diários.

Após uma sucessão de anos muito quentes e secos no Douro, o ciclo de crescimento e a vindima de 2021 foram dos mais frescos dos últimos anos. Enquanto grandes extensões da Europa se debatiam com calor extremo (o mês de julho foi o mais quente alguma vez registado no continente), o Douro teve um verão bastante fresco, sem as ondas de calor que se têm tornado comuns na região. Condições moderadas em 2021, contribuíram para maturações mais lentas e graduais, o que favoreceu o equilíbrio, enquanto a vindima foi definida por três períodos de chuva que influenciaram a sequência de corte das uvas. As noites invulgarmente frescas contribuíram para excelente acidez e cor nos vinhos.

Dentro da perspetiva dos últimos anos, a vindima de 2021 pareceu um interlúdio de frescura na viagem climática a que estamos a ser sujeitos no Douro. Serviu para nos recordar que a nossa região tem a capacidade de surpreender e permite-nos produzir cada ano vinhos Douro e vinhos do Porto com perfis bem diversos.

Agilidade e adaptabilidade

A previsões meteorológicas antes e durante a vindima foram menos fiáveis do que é habitual, com constantes alterações, em pouco tempo útil, o que nos obrigou a sermos ainda mais flexíveis na tomada de decisões. Embora a previsão apontasse tempo soalheiro e seco para o arranque da vindima, registou-se precipitação abundante nos dias 1 e 2 de setembro — com cerca de 40mm no vale da Vilariça. A chuva foi, de um modo geral, benéfica e abrandámos o ritmo da vindima logo de início para permitir que as vinhas tirassem o máximo proveito da água. Felizmente, o céu voltou a limpar e proporcionou boas condições para progredirmos com os nossos planos de corte.

Começamos com o Sousão no dia 30 de agosto, o qual produziu vinhos incríveis. Seguiu-se rapidamente o Alicante Bouschet, cujas plantações começam a atingir a maturidade. Estamos muito satisfeitos com o desempenho destas duas castas, até porque tivemos um papel preponderante na sua reintrodução no Douro nas últimas duas décadas — com destaque para o Alicante Bouschet.

A instabilidade atmosférica regressou nos dias 13 e 14 de setembro com mais precipitação, desde os 20mm registados nas nossas quintas do Cima Corgo, aos 30mm no Douro Superior. Após nova pausa no corte das uvas, voltámos a vindimar no dia 18, começando com a Touriga Nacional. Congratulamo-nos com esta decisão pois as uvas deram entrada na adega com níveis baumé ideais de 13° a 14°. Embora os vinhos não têm a exuberância aromática de outros anos, possuem muito boa cor e são um pouco mais retraídos, o que até pode ser positivo em termos do equilíbrio e elegância final dos vinhos.

Embora o ciclo de crescimento tenha sido mais fresco que o habitual, estava mais avançado uma vez que o abrolhamento ocorreu três semanas mais cedo que a média. Conforme prevíramos, começámos a vindimar — nalgumas das nossas quintas —, a Touriga Franca (uma casta de amadurecimento tardio) ao mesmo tempo que a Touriga Nacional. Esta revelou-se uma decisão chave porque conseguimos vindimar as nossas melhores parcelas de Touriga Franca antes do terceiro episódio de chuva do mês. Alguma da Franca que ficou por vindimar durante a reta final da vindima foi certamente impactada pelas condições de humidade.

Uma vindima lenta e longa

As temperaturas mais amenas e os três períodos de chuva impuseram um ritmo mais lento ao longo de toda a vindima. No Cima Corgo, registou-se cerca do dobro da chuva comparativamente à média mensal (na Quinta do Bomfim, da Dow’s e na Quinta dos Malvedos, da Graham’s) e cerca de três vezes acima da média no Douro Superior (Quinta dos Canais da Cockburn’s e na Quinta do Vesúvio). O resultado foi uma vindima que se estendeu por mais de seis semanas, em assinalável contraste com a vindima anterior que durou menos de um mês.

Apesar do tempo não ter sido sempre ideal, os episódios de chuva limitaram-se a períodos de 24-36 horas. A agilidade das nossas equipas de viticultura e enologia fez com que pudéssemos, mesmo assim, vindimar as nossas melhores parcelas nos timings mais propícios. Embora as produções (Kg/vinha) nas nossas propriedades tenham estado cerca de 10% abaixo da média da última década, a produção total esteve 24% acima de 2020 (devido a uma maior colheita em termos absolutos).

ALENTEJO

A vindima na nossa Quinta da Fonte Souto na sub-região alentejana de Portalegre, foi ainda mais demorada que no Douro. Começámos a vindimar a 17 de Agosto e terminámos no dia 8 de outubro. Começámos pelo Verdelho, seguido do Aragonez (sendo o primeiro corte desta casta para o Fonte Souto Rosé, vinho que inaugurámos com a colheita de 2020). O Arinto foi vindimado a partir do final de agosto, em vários lotes, de modo a produzir vinhos com perfis diferenciados.

Durante a primeira quinzena de setembro, procedemos a um segundo corte de Aragonez (para vinho tinto) e demos início ao corte do Alfrocheiro. Após uma pausa, resultante de temperaturas mais baixas e chuva, vindimámos as restantes castas tintas: Alicante Bouschet, Syrah, Touriga Nacional e Trincadeira. Os vinhos da Fonte Souto de 2021 definem-se pela elegância, com a acidez e exuberância aromática conferidas pelo ano fresco.

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Charles Symington
Enólogo Principal & Diretor de Produção · Outubro de 2021

Publicado em 2021-11-23
© Symington Family Estates

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